Nascida em 1943, estudou arquitetura no Instituto Israelita de Tecnologia entre 1963 e 1966, ingressando em 1970 na Faculdade de Psicologia, na PUC. A menina burguesa cedo casada, logo se liberta e se divorcia. Vai para a França trabalhar com psicologia alternativa frequentando os cursos de Foucault, Guattari, Deleuze, percebendo que éramos “máquinas desejantes”. Trabalhou como assistente de professora até se formar em 1974. Entre 1973 e 1977 manteve um consultório particular de psicologia clínica. Passou a viver de cinema trabalhando em filmes a partir do curso de direção de produção que faz no MAM. Mas, para ela, o cinema era uma ferramenta e não uma carreira.

Participa da ABD e da Corcina e, logo depois, do Coletivo de Mulheres de Cinema, um desdobramento do movimento que toma força com a Conferência das Mulheres da ONU em Nairob, no Quênia. Roda os primeiros filmes com sucesso, e em “Cidadão Jatobá”, sobre os índios do Xingu, faz parceria com Paula Gaitan. Além de seus filmes, trabalha em planejamento de produção, fazendo orçamentos de longas na empresa Gaumont, e fez pesquisa para documentários da BBC.

Filmografia

. Creche Lar, documentário, 16mm, 9’, fot. Noilton Nunes, Na Vila Kennedy, a comunidade se organiza e cria, sob a liderança de uma freira, um modelo de creche alternativo.

. Teu nome veio de África, documentário, 1979

. Cidadão Jatobá, documentário, 14’, 16mm sobre os índios do Xingu. 

. Naverdade.

Formação

Estudou Belas Artes por um ano. Estudou arquitetura em Israel. Interrompeu os estudos, voltou e casou. 1970 entrou para Psicologia já com filho. A menina burguesa se liberta, se divorcia. Aos 28 anos tem seu primeiro trabalho remunerado. Forma-se em 74. Em 73 foi para a França trabalhar com psicologia alternativa. “Fase marcante” em que conviveu com Foucault, Guattari, Deleuze, a percepção de que éramos “máquinas desejantes”, 68, o feminismo. 

Movimento de Mulheres

75, no Brasil, vinculou-se ao Movimento de Mulheres. Fundação do Centro da Mulher Brasileira, primeiro grupo de mulheres assumidamente feminista. Jana – presa política –apresentou-a ao Noilton. 

Cinema

Assistiu a todas as Chanchadas. Nos anos 60 estava em Israel, não vivenciou o Cinema Novo. Interessou-se pelo fazer cinematográfico com Noilton Nunes, em uma época em que trabalhava nos presídios femininos, dando assistência psicológica às presas.

Creche Lar

Uma pesquisa, do grupo do Centro da Mulher Brasileira, sobre creche, virou o primeiro filme. Na Vila Kennedy, a comunidade se organizou e criou, sob a liderança de uma freira, um modelo de creche alternativo. No desejo de documentar essa experiência, ingressa no “cinema” com o curta “Creche Lar”. Noilton Nunes fez câmera. 16mm, 9’, não lembra da distribuição.

Cinema e Militância

“Praticamente todo o filme que fiz tem uma meta, vamos dizer, é para o movimento dos índios, ou é para o movimento do negro. E é um momento em que minha vida estava vinculada ao movimento”

“A partir de uma causa que eu tinha abraçado, de uma coisa na qual eu acreditava, na qual eu queria contribuir. E minha maneira de contribuir era fazer um filme. Era o que eu tinha para dar, para oferecer. Era fazer um produto com o qual eles pudessem trabalhar, que mostrasse alguma coisa, que de certa forma eles quisessem dizer”. 

Candomblé

Maria Luisa e o marido à época Sérgio ficam bastante envolvidos com a comunidade do candomblé. Seu segundo filme, de 79, já está dentro do contexto da Corcina e da Lente Filmes (D’aboim passa a ser sócia da produtora, inclusive), “Teu nome veio de África” ganhou concurso de roteiros da Funarte & MAM, do qual veio verba para produção, é um filme de candomblé.

Cultura Popular e Burguesia

Joãozinho da Colméia, líder espiritual carioca da tradição de Angola (diferente da Bahia). No Rio o Candomblé foi um modismo. Contato com o movimento negro, mas identificação com o movimento das mulheres.

D’aboim e Mercado

“Eu tenho muita dificuldade de lidar com isso, eu nunca procurei, eu sempre admiti que eu nunca iria conseguir viver de cinema”.

Trabalhar na Globo era impensável para D’Aboim. Viveu de cinema enquanto trabalhou os filmes dos outros (começou com Ramalho, no curso de Direção de produção, em 77, no MAM, em que realizaram filme – patrocinado pela Embrafilme) também não poderia viver disso. Cinema era uma ferramenta e não uma carreira.

Lembranças D’aboim e Corcina

“Não são muitas. Totalmente emocional”. D’Aboim fala de um ambiente de pessoas que pensavam nas condições de se fazer cinema. Mas para D’Aboim, “Corcina era uma maneira de se tentar produzir”. De ter equipamento mais barato, de ter um banco de fita – quem queria contribuir dava ponta de filme – de ter pessoas para ajudar na realização, sob regime de cooperativa. “Um bando de gente jovem querendo fazer filme e tentando viabilizar o seu trabalho. E foi Da ABD, a Corcina e, logo depois, o Coletivo de Mulheres de Cinema” – um desdobramento do movimento de mulheres, que toma força com a “Conferência das Mulheres- ONU, em Nairob, no Quênia”. “Ter um cinema do ponto de vista da mulher” 

Coletivo de Mulheres de Cinema

Início dos anos 80. Trocava-se muita informação, de uma maneira aberta e democrática. Pedia-se visibilidade dos filmes feitos pelas mulheres nos festivais, além de se acharem espaços próprios. Percebia-se uma forma própria nos filmes das mulheres.

Cidadão Jatobá

O filme “Cidadão Jatobá” Começou com Paula Gaitan. Projeto desencadeado a partir de dois livros, um de Karl Van “Benshteinen”, sobre os índios do Xingu (seu transporte era a canoa de jatobá). Ganhou concurso de 88, do CTAV, e ficou à espera da verba para produção. Não poderia perder a época em que o Jatobá libera sua casca, então conseguiu verba para realizar essa parte do filme e foi para o Xingu. Aproximou-se do movimento indígena a partir de um depoimento do índio Terena, que se assumiu japonês para inserir-se socialmente (era aviador). Também ela sente a opressão social, pois é mulher. O projeto do filme não era um projeto de cinema, mas um projeto de vida, “Não é um projeto de vida no sentido de que eu sei o que eu vou fazer ali adiante, mas em que eu tenho clareza que minha energia eu quero por à serviço da libertação, da liberdade, do crescimento do ser humano”. 

“Não fui fazer Cidadão Jatobá porque a lei do curta permitia que você botasse um filme de 14 minutos. Ele veio de outra origem. Depois a gente filmou em 16mm. Têm histórias fantásticas. A gente levou 6 latas para o Xingu. Se você está fazendo um filme sobre uma canoa, você tem que botar a canoa dentro d’água. Você constrói, constrói a canoa e não vê a canoa dentro d’água. Só que a gente tava filmando uma coisa que ninguém tinha visto. Eu tinha lido no livro do Karl Van “B…”, do século XVIII, como é que se construía. O Aritana, que era o único que falava português nunca tinha visto construir. O pai e o avô dele, que tinham visto, não construíam isso há 30 anos – ou há 40, ou há 50 -, porque desde que eles estavam fechados numa reserva eles não precisavam mais desse instrumento exploratório, que é esse tipo de canoa. Depois o jatobá estava em extinção… Então nasceu disso, e não para fazer um filme pro cinema”.

D’Aboim acrescenta que ela se sentia responsável por introduzir a experiência cinematográfica naquela tribo. E desse sentimento vem o compromisso de deixar cópias do filme com os índios.

Jatobá na Jornada da Bahia

O grande prêmio foi a apreciação de Jean Rouch. Foi a única vez em que foi à Jornada da Bahia. Ela recém desquitada, mãe de três crianças, tinha suas dificuldades. Mas sempre participou muito das mostras e dos festivais.

Rio da Cruz

Sílvio Tendler telefonou para D’aboim pedindo-lhe uma proposta de filme, isso após o “sucesso” de “Cidadão Jatobá”. Ele dirigia a Rio Arte e, portanto, tinha verba para realização de filmes. Pediu a D’Aboim para fazer um projeto sobre o Rio daquela época, e era mesmo o seu desejo. Com inflação de 400%, e com a demora de 8 meses, o orçamento inicial não cobriria as despesas da proposta original de “Rio da Cruz”. “Na verdade ele foi o que ele pôde ser”. Guilherme Vaz fez a música. Sem verba para finalização e sem autorização de uso de trilha sonora (por exemplo a de Paulo Moura), o filme ficou “experimental”, “sem texto, que fala por ele mesmo, ele e a música”. Tendler deveria apresentar resultados e aceitou o filme como estava. Porque não tem autorizações necessárias, D’aboim não libera a divulgação do filme.

Anos 80

Trabalhou em planejamento de produção, fazendo orçamentos de longas (temos lista dos filmes), na empresa Gaumont, dirigida por “Albicocco (Jean-Gabriel)”, cineasta-fotógrafo francês de relevância nacional (Cinema Novo). Gaumont – distribuidora francesa importante, “rodeada de figurões” do cinema nacional.

Doc BBC

Fez pesquisa para documentário da BBC, sobre “Reciclagem de Material” em Pernambuco para um diretor da BBC que, com o projeto aprovado, voltou com toda a equipe. Experiência inédita e agradável essa de se fazer cinema com padrão BBC. 

Entrevista 23/07/2004

Transcrição da entrevista