Paraense vem com a família para o Rio de Janeiro em 1962. Estuda no Colégio Militar, ingressa na Faculdade de Arquitetura da UFRJ, na Ilha do Fundão. Em 1971, começa a realizar filmes em Super 8, sendo um dos seus primeiros trabalhos um filme sobre a favela da Maré finalizado em 1974. Em 1972, viaja para Europa e depois ao Marrocos. Em 1976, Péo faz um curso de cinema no Parque Lage ministrado por Sérgio Santeiro. Ainda em 1976, pensando em realizar um filme sobre a Rocinha, muda-se para a favela, onde passará quase um ano morando. Da experiência, surge seu primeiro filme em 16 mm, Rocinha 77. Com este trabalho, Péo acabou se envolvendo no cotidiano da comunidade, criou o “Rocineclube” além de se aproximar da Associação de Moradores que à época funcionava de modo clandestino. Precisando de uma empresa para distribuir seus filmes pela Lei do Curta junto com os longas-metragens estrangeiros se envolve com a Associação Brasileira de Documentaristas e lá, juntando-se a outros realizadores com o mesmo problema, funda a Corcina, da qual Péo seria a grande liderança e seu primeiro presidente, nos anos crucias da Lei do Curta, pressionando a Embrafilme para se voltar também para esse numeroso grupo de novos e promissores realizadores. Na Corcina realiza uma série de filmes memoráveis sobre comunidades de favelas no Rio e difundindo a luta dos realizadores contra a sabotagem dos distribuidores a ao cumprimento da Lei do Curta. Em 1982 colabora na formação do Circo Voador, primeiro como arquiteto, depois produzindo uma série de vídeos com notícias e provocações, tentando torna-lo em espaço alternativo de exibição de “filmes culturais”, projeto que tem sua extensão no “Verão no Parque”, realizado no Parque Lage. Projeto que resultaria, em 1986, no filme O Muro, com a extraordinária atuação do ator Breno Moroni. Nanderú, de 1990, é o resultado de seu interesse e cumplicidade com a luta dos povos indígenas. Paralelamente trabalha em diversas comunidades populares como arquiteto, nelas permanecendo como morador atuante. Ativista, poeta, é um dos personagens centrais dessa floração de realizadores cariocas, brasileiros, da segunda metade do século XX.
Filmografia
. Pira, curta-metragem, ficção, super-8, 1971
. Explendor do Martírio, curta-metragem, ficção, super-8, 1974
. Maré, curta-metragem, documentário, super-8, 1974. “feito na Maré em 74 (…) eu fiz um filme no morro do Timbau, que é aquele morrinho que tem ali na entrada da Cidade Universitária da parte da Maré, e era um filme que mostrava o local, falava da vida das pessoas, do esforço da associação de moradores”[1].
. Póstuma, curta-metragem, super-8, 1975
. Ame, curta-metragem, super-8, 1976
. Rocinha 77, curta-metragem, documentário, 16mm, cor, 1977, sobre a favela da Rocinha, mergulho cinematográfico e antropológico no outro lado da cidade partida. Péo ficou morando quase um ano na favela para realiza-lo. O que mais chama atenção no filme é ausência de pré-julgamentos ou qualquer ranço de discurso paternalista. A narração off do filme é construída inteiramente a partir do depoimento dos moradores da favela. A câmera de Ricardo Jochem (falecido logo após a realização com o filme tendo sido dedicado a ele) percorre as ruas da favela em grandes planos sequência, vasculha os espaços como um espírito andarilho cheio de curiosidade pelo que vê, curiosidade que é também profunda admiração: “A favela em termos de filosofia de espaço é muito mais rica” – afirma Péo, o arquiteto. Prêmio festival JB/Mesbla, prêmio ONU/Movimento Anti-Apartheid, menção honrosa Festival de Oberhausen e prêmio especial do IAB, Instituto dos Arquitetos do Brasil, 1978.
. Cinemação Curtametralha, curta-metragem, documentário, 35mm, cor, 1978, filme realizado exatamente quando foi aprovada a lei e ia começar a vigorar o espaço para o curta-metragem nas salas de cinema e houve um boicote ordenado pelos distribuidores nas salas de cinem. “Então, esse filme foi um filme panfletário. É uma denúncia, foi uma reunião na porta do cinema para distribuir panfletos, para mexer com as pessoas. È uma manifestação que atravessou o período de Carnaval. Misturou com o bloco do Cacique de Ramos que avançava na avenida Rio Branco, e a gente panfletando. Índios, índios vestidos com uma linguagem pop, pop! Enfim, isso foi um cinema ação curta metralha. Era um filme guerrilheiro. Era a guerrilha do cinema”.
. Associação Moradores dos Guararapes, curta-metragem, documentário, 35mm, cor, 1979, filme sobre Guararapes, favela da zona sul carioca. O filme é construído a partir do depoimento de Cláudio Moraes, líder da Associação de Moradores. Aqui ele fala do fantasma da remoção, da evolução do movimento comunitário, da rebeldia á tutela, dos empecilhos que impedem o acesso aos benefícios instituídos por órgãos oficiais. E de uma experiência pioneira lograda pelos favelados: a compra da terra onde os barracos estão instalados. Surge então, novas formas de pleitear e manter seus lugares como segmentos participantes da sociedade. Prêmios no Festival de Gramado de 1979
. Concentração, curta-metragem, documentário, 16mm, cor, 16mm, 1979, o filme “foi uma estratégia…durante os jogos de futebol a cidade ficava completamente vazia, todo mundo ia…, jogos de futebol na Europa um e o outro na Argentina, o “Concentração” eu acho que foi na Argentina, Copa da Argentina, e que ficava a Avenida Rio Branco sábado… Não tem trânsito, nada, a gente botou um aparelho de televisão, eu inventei uma história de desenrolar de arame farpado imenso que o Eduardo Barreto, artista plástico, fez uma instalação com arame farpado, a construção dele é tudo isso, usar o espaço público enquanto ele está desocupado, esse é mais ou menos o teorema do Concentração, e quando terminou o jogo fizemos também algumas tomadas das pessoas vindo, descendo, porque o Brasil ganhou e virou um carnaval e inevitável(mente) isso acabou entrando no filme, o filme tem esse sentido, enquanto tudo pulsa acontece coisas estranhas na cidade, na rua, e a cidade está toda deserta, daqui a pouco todo mundo desce, os bares explodem, os carros saem apitando, particularmente esse filme foi essa experiência.”
. Cinemas fechados, curta-metragem, documentário, 35mm, cor, 1980, um poema de cinema-verdade, com intervenções do público, realizadores e atores presentes na Cinelândia. Prêmio Hors-concours no Festival de Gramado.
. Contradições urbanas, média-metragem, documentário, vídeo Betacan, 1981, o filme começa numa pergunta, “de quem é o espaço urbano quando você coloca o pé fora de casa?”, dentro de casa você está dentro da sua casa, da sua porta, mas quando você abre a porta e sai na rua, de quem é a rua? Quais são os proprietários? É o povo? É o governo? A polícia? É o cidadão enfim, o cidadão que é o dono da rua, o cidadão que tem que cuidar da rua, que tem que eleger os administradores. A gente pegou como amostragem a Selva de Pedra (Leblon) construída exatamente onde era a Praia do Pinto, alguns anos antes; a cruzada que também foi construída ainda no tempo da praia do Pinto e permanece até hoje, e um bairro tradicional o Catumbi, que tinha sofrido uma forte interferência com a abertura do túnel em Laranjeiras. Um teorema inicial do Molic, do Ricardo Fazzanelo dois dos colegas de faculdade de Péo. Patrocinado pela FINEP sendo um filme institucional, a versão original acabou retornando para Péo pelos seus direitos como autor, uma vez que o Ibam que era o gestor do projeto não aprovou o resultado e decidiu fazer uma nova versão.
. ABC Brasil, curta-metragem, documentário, 35mm, cor, 1981, documentário de curta-metragem sobre as greves dos metalúrgicos do ABC de São Paulo, onde já despontava a liderança de Luiz Inácio Lula da Silva. Confiando na força das imagens, tendo como ponto de partida o comício de Lula no primeiro de maio, exibido em grandes planos-sequência, e apenas costurando os fatos com breves trechos de narração off, ABC Brasil documenta o período de um ano de luta do operariado paulista, culminando com a nomeação de Lula ao cargo de presidente do recém-criado Partido dos Trabalhadores em maio de 1980.
. Série documental do projeto de shows ROCK VOADOR (1982/84) – vídeo
. Série Documental do Projeto VERÃO NO PARQUE (1985) – vídeo
. O Muro – Curta-metragem, ficção, 35mm, 1986, filme realizado quando Péo estava trabalhando num projeto de animação da Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Muro surge, portanto, a partir desse primeiro envolvimento. No filme, um ator passeia em frente a um muro com diversos trabalhos de pintores da Escola de Artes Visuais do Parque Lage reagindo com pantominas a cada obra particular. Sobre O muro, Péo disse em entrevista: “O meu filme está pensando em cima de uma visão daquela iniciativa de pintar, da reunião dos artistas, de se colocar na fachada da Escola”. Protagonizado por Breno Moroni.
. Nanderu – Panorâmica Tupinambá, curta-metragem, documentário, 35mm, cor, 1990, filme propõe, segundo Péo, “uma revisão em nossa cultura brasileira e, extrapolando, a americana desde sua origem no séc. XVI. O caráter profundamente ecológico das palavras do cacique Vera Miri talvez ajude abrir a porta para uma reflexão maior sobre nossa identidade cultural, hoje bastante diluída. O resgate dessa nossa herança indo-americana se faz urgente em nosso processo civilizatório sob pena de cumprirmos um processo de desenvolvimento robotizado”